sábado, 21 de abril de 2012

Não tenho fé para ser ateu - Que tipo de deus?

Norman prossegue fazendo a acertada pergunta sobre qual tipo de deus estamos falando. De fato, antes de entrar em qualquer tipo de debate religioso, é necessário estabelecer se estão falando do mesmo deus, visto que a enorme gama de possibilidades de deuses criados pelo homem podem tornar o debate confuso, frustante  e inconclusivo.

Norman, no entanto, estranhamente inclui apenas três tipos de visões: teísmo, panteísmo e ateísmo:

"A maioria das principais religiões mundiais encaixa-se em uma dessas três categorias de visões religiosas: teísmo, panteísmo e ateísmo".

Norman se esquece de mencionar o deísmo, a postura filosófica que difere do teísmo por acreditar na existência de deus, porém este não interfere no universo nem na vida humana, e dos quais participaram alguns dos maiores pensadores da história, como Voltaire, Spinoza, Galileu, Newton e Thomas Paine, entre muitos outros. Para o deísmo, então, não existem milagres, nem maldições, nem inferno, nem paraíso. Deus existe, mas apenas ligou o motor inicial do universo, e deixou ele correr sozinho.

Norman também não cita o politeísmo, provavelmente a forma mais antiga de religião, desde os sumérios na idade de bronze, até o hinduísmo contemporâneo, como praticado na Índia, Nepal, Bangladesh, etc, e compõem a terceira maior religião do mundo.

Acho improvável que alguém com o know-how de Norman Geisler não tenha conhecimento sobre o deísmo e o politeísmo, então imagino que ele não tenha considerado-os relevantes o suficiente para sequer citá-los em seu livro.

"O teísta é a pessoa que acredita num Deus pessoal criador do Universo, mas que não é parte do Universo. Isso seria mais ou menos equivalente ao pintor e à pintura. Deus é o pintor, e sua criação é a pintura. Deus fez a pintura, e seus atributos estão expressos nela, mas Deus não é a pintura. As principais religiões teístas são o cristianismo, o judaísmo e o islamismo".

Acrescentaria nesta definição que os teístas também acreditam que deus não só pode como muitas vezes não hesita em alterar as leis da natureza para seus próprio fins, ou seja, pratica milagres, curas e bênçãos, bem como maldições, castigos divinos, e toda sorte de influências sobrenaturais sobre a vida dos seres humanos. Aliás, não apenas isso, mas esses tipos de deuses tem um interesse especial em nossas vidas (especialmente em nossa vida sexual), e nos punem ou nos recompensam após a nossa morte de acordo com nossas ações enquanto vivos.

"Em contraste, uma pessoa panteísta é alguém que acredita num Deus impessoal que literalmente é o Universo. Assim, em vez de fizer a pintura, os panteístas acreditam que Deus é a pintura. O fato é que os panteístas acreditam que Deus é tudo o que existe: Deus é a grama, Deus é o céu, Deus é a árvore, Deus é este livro, Deus é você, Deus sou eu etc. As principais religiões panteístas são orientais, tais como o hinduísmo, algumas formas de budismo e muitas formas da 'Nova Era'."

Ele incluiu o hinduísmo como sendo uma forma de panteísmo? o.O

Certamente o hinduísmo é uma grande mistura de várias tradições e costumes desde os tempos primordiais, assimilando crenças mais diversas entre si e variando de região em região, incluindo aspectos do politeísmo, monoteísmo, panteísmo, monismo e até ateísmo, gerando um conceito de deus complexo e que pode variar de pessoa para pessoa. Mas simplesmente rotular o hinduísmo como panteísmo é um erro crasso.

Um ateu, naturalmente, é alguém que não acredita em nenhum tipo de Deus. Seguindo nossa analogia, os ateus acreditam que aquilo que se parece com uma pintura sempre existiu e ninguém a pintou. Os humanistas encaixam-se nessa categoria.

Considerando então os erros e definições incompletas anteriores, estava até com medo do que sairia do ateísmo, mas ele ele até que se saiu bem; ateísmo é bem isso mesmo, apenas uma pessoa que não acredita em nenhum tipo de deus.

A analogia com "uma pintura que sempre existiu e ninguém a pintou" é meio equivocada e induz ao erro. Para aproveitar a analogia, não diria que é de fato uma pintura, mas um borrão, uma mistura de cores que pelo aspecto peculiar alguém assume que foi pintada por alguém. Como uma imagem de Jesus em uma tampa de catchup ou em uma barra mordida de Kit Kat, as pessoas querem ver a obra de um criador, quando na realidade não existe nenhum.


E sobre a questão de "sempre existir", também é errônea. Já temos comprovações suficientes para estabelecer além de qualquer dúvida razoável que, pelo menos esse universo em que vivemos, teve um início, através do Big Bang. O que existia antes dele ainda é motivo de discussão, e é até difícil definir o que significa "antes do Big Bang", já que antes dele não havia o tempo. Mas existem algumas teorias que podem dar explicações no mínimo satisfatórias, as quais certamente veremos mais adiante com melhores detalhes.


Veja a seguir uma maneira fácil de memorizar essas três visões religiosas: teísmo — Deus fiz tudo; panteísmo — Deus é tudo; ateísmo — não há Deus.

Essa definição extremamente simplificada do que é deus realmente não me parece satisfatória.

Por exemplo, o teísmo ainda engloba um espectro gigantesco de deuses, variando entre o mais intrusivo, que regula e vigia todos os aspectos da vida humana, tal como o deus bíblico do antigo testamento chamado Jeová, até o deus dos não-religiosos, aquelas pessoas que acreditam em deus, mas não seguem nenhuma religião, apenas acreditam no deus invisível e genérico que nunca se revelou a nenhum profeta em particular, tolerante e que não pune ninguém eternamente.

Sabemos que o deus de Norman Geisler é o deus cristão, mas ainda assim é possível uma variedade de "deuses cristãos". O deus dele é o deus da predestinação (calvinistas) ou do livre-arbítrio (arminianos)? É o deus do pós-milenismo, pré-milenismo ou amilenismo? É o deus que aboliu as leis mosaicas (pentecostais) ou ainda as mantém (adventistas)? É o deus que tolera homossexuais (Igreja Deus é Amor) ou os odeia (Westboro Baptist Church)? A lista pode prosseguir indefinidamente.

No entanto, é importante ter isso bem definido, ou pelo menos, o mais definido quanto puder, pois ainda que não seja possível provar que deus não existe, é possível provar que determinados deuses não existem, baseado nas contradições internas de suas palavras e baseado no seu caráter. Por exemplo, o deus genérico dos teístas mencionado antes, sem forma e invisível que nunca apareceu a nenhum profeta é mais difícil de provar do que o deus bíblico Jeová. Ou seja, quanto mais informações tivermos a respeito de determinado deus, tanto mais fácil é "pegá-lo" em contradição ou em incoerência.

Imagino que no decorrer do nosso estudo teremos uma definição melhor de que tipo de deus Norman se refere em seu livro - qual deles ele pretende defender.

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Um comentário:

  1. Estou tendo dificuldades em encontrar o próximo tópico, uma vez que sou novo no site, ou ele ainda não foi publicado? Agradecido! AH... Sim... seixa eu me apresentar: sou Daniel. como disse: novíssimo no site. encontrei este ambiente porque recentemente comecei a ler o livro em questão(após indicação de um amigo "formado em filosofia") e na procura do livro em pdf esbarrei neste site. Até aqui só tenho a agradecer.

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